tiamat

Tiamat é uma deusa das mitologias babilônica e suméria. Na maioria das vezes Tiamat é descrita como uma Serpente do Mar ou um Dragão mas nenhum texto foi encontrado nos quais contenham uma associação clara com essas criaturas.

Inicialmente, quando o mundo cultuava divindades femininas com suas várias faces, Tiamat era adorada como a mãe dos elementos.  Tiamat foi responsável pela criação de tudo que existe. Os deuses eram seus filhos, netos e bisnetos.

O reino da Babilônia se desenvolveu ao sul da Mesopotâmia durante 2200 até 538 a. C., quando os persas conquistaram a cidade. Os babilônios eram os herdeiros do grande legado cultural dos antigos sumérios.
Para os babilônios como para o sumérios, o rei obtinha sua autoridade diretamente dos Deuses. Por exemplo, o rei Hammurabi afirmava que havia recebido as leis de seu Código diretamente da mão do Deus Sol Shamash. Os reis eram tão importantes que, em anos recentes, o agora condenado ditador Saddam Hussein (nascido em 1937), justificava em parte sua soberania sobre o Iraque atual, comparando-se com o rei Nabucodonosor, que governou desde o ano de 606 até 562 a. C.

A história de Tiamat pode ser encontrada no épico babilônico Enuma Elish, data do século XIX-XVI a. C., que foi cantada ante a estátua de Marduk, Deus principal babilônico, celebrando a fundação do mundo e da própria Babilônia que era o centro do mundo.
Tudo inicia-se com o caos aquático. Apsu a água doce que origina rios e riachos, e Tiamat, o mar ou as águas salgadas (representada na forma de um dragão), combinam seus poderes para criar o universo e os Deuses.

Os primeiros dois Deuses chamaram-se Lachmu e Lachamu. A primeira prole se reproduziu e formou-se outra prole. Esses Deuses irritavam profundamente Apsu que convocou seu auxiliar Mummu e foram juntos a Tiamat, a quem disseram que a descendência de ambos deveria ser eliminada para que regressasse a tranquilidade. Tiamat, entretanto, enfureceu-se rechaçou a ideia, pois embora estivesse perturbada com os ruídos dos deuses, os perdoava.

As crianças Deuses acabam descobrindo que Apsu tinha plano de matá-las e enviam o Deus Ea para matá-lo primeiro.
Tiamat não apoiava os planos de Apsu de destruir seus filhos mas, diante da morte de seu esposo, passa a lutar contra eles. A Deusa encontra outro companheiro, Kingu, com quem gera vários monstros: serpentes de garras venenosas, homens escorpiões, leões demônios, monstros tempestade, centauros e dragões voadores. Depois, partiu para a retaliação.

Antes designou Kingu como chefe de seu exército dizendo:
-“Exaltando-te na assembleia dos Deuses, eu te dou o poder para dirigir todos eles. Tu és magnífico e meu único esposo. Que os Anunnaki exaltem teu nome.”

Entregou-lhe então as Tábuas do Destino. As crianças Deuses temiam lutar contra Tiamat até que Marduk, filho de Ea, decidi lutar contra ela. O restante dos deuses rebentos prometeram a Marduk que, em caso de vitória, ele seria coroado como rei dos Deuses.
Marduk teceu uma rede e apanhou Kingu e todos os monstros. Ele os acorrentou e os atirou no Submundo. Partiu então para matar Tiamat. Primeiro Marduk cegou o dragão com seu disco mágico, possivelmente representado pelo próprio sol, pois o Deus era também um herói solar. Depois feriu mortalmente Tiamat com uma lança, símbolo da vontade criativa e procriação. O herói teve ainda o auxílio dos sete ventos para destruir Tiamat. Com metade do corpo dela ele fez o céu, e com a outra metade a Terra. Tomou sua saliva e formou as nuvens e de seus olhos fez fluir o Tigre e o Eufrates. Finalmente de seus seios criou grandes montanhas.

Os humanos foram criados a partir do sangue de Kingu misturado com terra. Marduk, de posse das Tábuas do Destino, criou em seguida, uma habitação para os Deuses no céu, fixou as estrelas e regulou a duração do ano e fundou a cidade da Babilônia para que fosse sua residência terrestre.
Outros mitos, descrevem o processo de criação como um fluxo contínuo de energias originadas do sangue menstrual de Tiamat, armazenado no Mar Vermelho ou Tiamat, em árabe. Foi essa a razão pela qual, mesmo após a interpretação patriarcal do mito, na qual foi acrescentada a figura de Marduk, que teria matado Tiamat, o Dragão do Caos e criado o mundo com seu corpo, foi mantido na Babilônia, durante muito tempo, o calendário menstrual, celebrando os Abbats e nomeando os meses do ano de acordo com as fases da Lua.

O mistério de Tiamat e de Marduk era comemorado anualmente na Babilônia durante o Ano Novo ou no festival de Akitu.
Pouco resta da magnífica cidade da Babilônia, somente uns quatro bancos de barro às margens do rio Eufrates, sul da atual Bagdá, Iraque. Porém um dia, a cidade da Babilônia foi famosa por seus “jardins suspensos”, uma das maravilhas do antigo mundo. No coração da cidade estava o templo de Marduk, a Casa da Fundação do Céu e da Terra.

Como em incontáveis mitos, a origem de toda a vida teria vindo do mar primordial, quer na terra, ou no céu, mas o que existe de comum em todas estas possíveis procedências são as trevas primordiais. São delas que se origina a luz, sob a forma de luz ou estrelas e do dia acompanhado pelo sol. É esse fator comum, a escuridão da noite primordial como símbolo do inconsciente que explica a identidade entre o céu noturno, terra, mundo inferior e água primordial anterior à luz. Com efeito, o inconsciente é a mãe de todas as coisas, e tudo o que surgiu depois e permanece na luz da consciência está em uma relação filial com a escuridão. Designamos como urobórica, essa situação psíquica primordial, que abrange os opostos e, ma qual os elementos masculinos e femininos, os inerentes à consciência e os hostis a ela, confundem-se uns com os outros.

Na Babilônia, a unidade masculino feminina dos uroboros era constituída por Tiamat e Apsu, que representavam o caos primordial da água. Mas é Tiamat, o verdadeiro elemento de origem, a mãe de todos os deuses, e a possuidora das tábuas do destino.
A existência original de Tiamat também resulta do fato desta ter sobrevivido à morte de Apsu e, quando finalmente derrotada pelo Deus sol patriarcal Marduk, formam-se a partir de seu corpo a abóbada celeste superior e a abóbada inferior das profundezas. Assim, mesmo depois de ter sido derrotada, ela permanece como o Grande Círculo que tudo contém.

Tiamat, não é apenas o monstro terrível (dragão) do abismo, tal como a via o mundo patriarcal daquele que a venceu, Marduk. Ela é não só geradora, como também a mãe legítima de suas criaturas, que se enfureceu quando Apsu decidiu matar os deuses que eram seus filhos. Somente depois destes terem assassinado Apsu, seu marido, o pai primordial, é que ela dá inicia à sua vingança e propaga a sua força destruidora.
Tiamat representa o poder irracional dos primórdios e do inconsciente criador. Mesmo na morte, ela continuou a representar o mundo superior e o inferior. Marduk, ao contrário, é um legislador. A cada uma das forças celestes ele atribuiu um lugar fixo e, como Deus bíblico do Gênese, organizou o mundo segundo leis racionais que correspondem à consciência e sua natureza solar.

O caráter numinoso da Grande Deusa ainda se manifesta na forma de um Dragão em Tiamat, entretanto, é mais frequente este deusa primitiva surgir despida e com características sexuais acentuadas quando a ênfase recai em sua fecundidade e em seu caráter sexual.
Taimat não é uma Deusa cruel, mas seus templos eram escondidos, devido a sua impopularidade, provavelmente por causa dos sacrifícios humanos que faziam parte de seus rituais. Isto mudou, em algumas cidades do Império, quando Tiamat passou a ser adorada abertamente e onde, os rituais mais sangrentos eram executados raramente.

Tiamat representa todos os cinco elementos chineses: terra, água, fogo, ar e metal.

A DERROTA DA DEUSA

O Enuma Elish é a primeira história da substituição de uma Deusa Mãe por um deus que “fabrica” a criação como algo distinto e separado de si mesmo. Em todos os mitos da Idade do Ferro (que começa em 1250 a.C.) em que um deus do céu ou do sol vence a uma grande serpente ou dragão, podemos encontrar traços desse poema épico babilônico, nele a humanidade foi criada a partir do sangue de um deus sacrificado, e não há útero de uma Deusa primordial. Sua influência pode ser rastreada ao longo da mitologia hitita, assíria, persa, cananeia, hebreia, grega e romana.

Na cultura da Deusa, a concepção da relação entre “criador” e “criação” se expressa na imagem da Mãe, como “zoé”, a fonte eterna, dando a luz a seu filho como “bios”, a vida eterna criada no tempo, que está viva e que ao morrer regressa à fonte. O filho era a parte que emergia do todo, através da qual o todo podia chegar a conhecer-se a si mesmo. A medida que o deus “cresceu” no transcurso da Idade do Bronze, chegou a ser consorte da Deusa e em algumas ocasiões cocriador com ela. Porém, na Idade do Ferro a imagem da relação representada no matrimônio sagrado desaparece e se perde o equilíbrio entre as imagens feminina e masculina da divindade que derivava da dita cerimônia.

Agora, um deus pai se estabelece em uma posição de supremacia em relação à Deusa Mãe, e se transforma paulatinamente em um deus sem consorte das três religiões patriarcais que hoje em dia conhecemos: o judaísmo, o cristianismo e o islam. O deus é então o único criador principal, quando antes era a Deusa quem havia sido a única fonte da vida. Porém, o deus se converte em fazedor do céu e da terra, enquanto que a Deusa era o céu e a terra. O conceito de “fazer’ difere radicalmente do de “ser”, no sentido de que o que se faz e quem o faz não compartilham necessariamente da mesma substância; pode conceber-se o que se faz como inferior a quem o faz. No entanto, o que emerge da Mãe é necessariamente parte dela, como ela também é parte do que dela emerge.

Portanto, a identidade essencial entre criador e criação se quebrou e desta separação nasceu um dualismo fundamental, o conhecido dualismo entre espírito e natureza. No mito da Deusa esses dois termos carecem de significado se forem considerados em separado: a natureza é espiritual e o espírito é natural porque o divino é imanente à criação. No mito do deus, a natureza já não é “espiritual” e o espírito já não é “natural”, porque o divino transcende da criação. O espírito não é inerente à natureza, mas está além dela e chega inclusive a converter-se em fonte da natureza. Assim, um novo significado se introduz na linguagem: o espírito se torna criativo e a natureza se torna criada. Esse novo tipo de mito da criação é resultado de uma ação divina que estabelece a ordem a partir do caos.

Podemos considerar esses mitos como relatos narrados pela humanidade em distintos momentos de evolução: ambos explorariam, deste ponto de vista, distintos modos de existir no universo. Porém, a atual tradição judeu cristã, apresenta implicitamente o mito da dualidade de espírito e natureza como “dado”, como inerente ao modo de ser das coisas. Aliás, sua origem na história humana se perdeu para a consciência: nas culturas patriarcais em que o deus pai se adorava como criador único não sobreviveu recordação alguma cuja forma possa conhecer-se das imagens anteriores da Deusa Mãe como criadora.

AS MUDANÇAS

O desejo de poder, junto com o medo, sempre presente, a ser atacado, explica em grande parte a necessidade de um deus cada vez mais poderoso, finalmente um deus “supremo”, capaz de um unir um povo embaixo de uma causa comum de defesa ou ataque. Porém, como resultado do predomínio do deus pai do céu, apareceu uma ideia de tempo diferente. Esse já não se concedia como cíclico, segundo o modelo lunar da Deusa Mãe, que acolhia de volta os mortos em na escuridão de seu útero. O deus pai não podia acolher os mortos em seu interior, nem devolvê-los à terra para renascerem. Portanto, o tempo tornou linear aos olhos da humanidade: tinham um começo no nascimento e um final na morte. De maneira similar, a própria criação, elevada a uma proporção cósmica, tinha um começo absoluto e teria um final definitivo, que coincidiria com o triunfo final da luz sobre a escuridão, uma afirmação definitiva da vitória original que havia dotado de existência o universo.

Esse modelo de tempo linear é que influenciou o “mito da criação” do século XX, segundo o qual o “big bang” marcou o início da vida e é possível que também está por detrás do temor contemporâneo ante ao “big bang” apocalíptico que marque o final dos tempo.(Pesquisa: http://www.rosanevolpatto.trd.br/tiamat.htm).

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